Powered By Blogger

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

ROSA DE SEDA


Rosa solitária,
perdida num ramalhete
de flores, sem cheiro,
sem o frescor das pétalas aveludadas
de uma rosa viva.
Olho para ti e penso,
será flor da noite ou flor
do amor,
disfarce coberto de seda
que não é rosa flor.
Rosa muda...não sente
o afeto
nos longos mergulhos,
no doce navegar
pelo remanso dentro
da noite.
As rosas são amorosas, belas,
serenadas, ardentes,
audaciosas,
a sonhar fascinadas à luz
do sol-poente,
faz reponte de melodias
e transluz a ternura
de um beijo.

Paulo Avila
Publicado no Recanto das Letras
Código do texto: T5512100
imagem captada na web  



Becicleta


Becicleta. Foi assim que grafei a palavra no meu exame de admissão ao
ginásio. Acho que nunca a houvera escrito antes, embora andasse em
minha boca e na de tantos garotos, loucos por uma Monark ou uma Calói
Havia também aquelas estrangeiras, importadas cujas marcas não se
pronunciava e muito menos se escrevia, mas babar à meninada fazia.
Raleigh, Gulliver, Merckswiss...
Mas a minha becicleta por pouco me deixa fora da reta, pois a prova de
português, a língua pátria do primário, era eliminatória e naquele
embate poderia significar o fim da minha incomeçada história, ou pelo
menos confiná-la a uma segunda edição, uma terceira, e não sei mais
não.
E o pior é que não foi uma única vez que incidi no erro: pois a prova,
além de constar de várias perguntas, tinha também a composição, que
por sua vez consistia na descrição de uma gravura. E justamente ali,
um menino com sua becicleta, e um ramalhete de flores.
Sabia como começar, pois algum mestre ou mestra já teria ensinado,
soprando a dica: descrição começa-se por dizer, vejo nesta gravura...
e o resto é literatura. Se o aplicador do exame mais atura.
Chegando em casa, ainda arfante daquela experiência ciclística no
papel, perguntei ao meu pai pela grafia em dúvida, buscando
assegurar-me do que podia vir pela frente. Bê, i, foi dizendo ele...
Pronto, tou perdido, disse comigo mesmo, engolindo aquele amargo
travo, quatro ou cinco vezes repetido, no papel.
Mudei de dúvida, para ver se me aliviava: qual o plural de qualquer?
Quaisquer, ora. Nossinhora, tava eu mesmo por fora. Havia escrito
qualqueres...E agora?
Quando anunciaram os resultados, consegui um 5,8. A iminente tragédia
havia virado com média. Que mérdia? E dali pra frente tudo foi
diferente, e o Roberto, já bem perto, mas ainda incerto, nem
incomodava a gente.

Paulo Miranda
Crônica publicada no Recanto das Letras
imagem captada na web

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

O tempo ...



Eu não envelheci. O tempo é que passou por aqui e tá
bem mudado. Quase não o reconheci. Lembro-me bem,
o tempo era jovem, cheio de planos, queria me ''fazer''.
Guardava-me para o futuro. Hoje ele tá velho,
o tempo enrugou! Falei baixinho pra mim:
''meu deus, o que o tempo fez com o tempo?!'' Corri
para o espelho e me vi igual e de esguelha o olhei; ele
para mim, de soslaio. Confesso que dei uma risadinha. Ficamos frente a frente.
Depois de tanto ''tempo'' era chegada a hora de conversarmos.
Não sabia por onde começar. Meio sem
jeito perguntei sua data de nascimento. Sabe o que ele
me respondeu? Que era imemorial. Pode?! Tentando disfarçar meu constrangimento, tossi. E o tempo continuou a falar...que era implacável, indomável, insinuante, que pertencia a todos, que fazia o que quisesse com quem bem entendesse. Tentei colocar a mão na sua boca, mas o tempo continuou a me falar, que era onipresente, que viu riso, choro, lágrima, lástima, traição e fidelidade eterna. Fiquei pasmo, lívido! Mas não podia perder a opotunidade, afinal, era eu conversando com o tempo. Tu já tiveste essa oportunidade? O achei presunçoso. Enquanto ele falava, minha cabeça girava tentando uma forma de reverter positivamente para mim, a conversa. Aí lembrei do passado. Com ar triunfal perguntei o que ele, o Tempo, o que ele achava do passado. Sua resposta foi o que motivou esse texto. O Tempo me falou que o seu passado, em algum tempo, sempre foi o seu futuro. Quase enlouqueci. Eu entro em êxtase com verdades. E o Tempo foi verdadeiro comigo.
(Nilson Octávio)

             imagem captada na web